Descaminho

7.2.05

Garçonete oprimida é clichê da vez


Leona Cavalli é a garçonete Lígia em Amarelo Manga

É impressionante como o cinema - mesmo o bom cinema - persegue personagens fáceis, que levam a uma identificação rápida do espectador. Um desses personagens da moda é o da "garçonete oprimida" que resolve tomar o controle de sua própria vida.

Há quatro bons filmes do cinema recente - dois brasileiros, um americano e um alemão - que pontuam suas histórias com uma garçonete oprimida. São eles: Amarelo Manga, Nina, Os Educadores e Sideways - Entre umas e outras.

Em Amarelo Manga (de Cláudio Assis), a garçonete em questão é Leona Cavalli que, cansada da vida que leva em Recife, assume ares de valentia e passa a enfrentar quem a maltrata. Em Nina, de Heitor Dhalia, a personagem-título (Guta Stresser) se revolta com o patrão e com os clientes que a tratam mal. Explode e nunca mais retorna ao restaurante onde trabalhava. A partir daí, seu perfil psicológico é cada vez menos submisso.

Em Os Educadores (de Hans Weingartner), a garçonete Jule (Julia Jentsch) também se cansa do trabalho sem fim para pagar uma dívida igualmente sem fim. Foge do posto de submissão e assume um discurso revolucionário.

Em Sideways - Entre umas e outras, a garçonete Maya (Virginia Madsen) não é tão submissa quanto a dos outros três filmes, mas recebe um olhar de desdém de um personagem (Miles) que logo depois se interessaria por ela . Mas há um momento do filme em que Maya ganha uma forte carga de vítima, o que acaba colocando-a na confortante posição de oprimida.

O paradoxo dos quatro filmes é que estão todos bem acima da média da produção atual. Mas não deixa de ser lamentável ver que a construção segue pobre, com recorrente busca de personagens de fácil identificação dramática.

3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Numa narrativa de ficção, a escolha de profissões não é aleatória. Estas "garçonetes" têm um significado, fazem partem da "economia" da trama. Cabe ao espectador encontrar o fio da meada para entender o porquê destas escolhas. Servir em restaurantes é um trabalho muito moderno, no sentido da flexibilidade, da falta de proteção legal. É a informalidade que não se restringe a camelôs. Talvez para pessoas intelectualizadas seja um universo impenetrável, um mero clichê.
Miguelim

6:26 PM  
Blogger P.F. said...

Só você para escrever um texto desses. Só você para observar isso. Engraçado, eu entendo perfeitamente e concordo com o que você coloca. Lembra que eu te disse que já trabalhei como vendedora em loja de shopping? Um trabalho não menos servil que o de garçonete. A experiência me capacita para concordar ainda mais com o que você diz. Essas personagens só refletem a moral do mundo: uma tendência excessiva à vitimização e à imposição de culpas às pessoas, que posteriormente também são encaixadas na categoria de vítima. No fundo, tudo não passa de acomodação. As pessoas passam a cultivar e propagar as diversas culpas para que possam eternamente se fazer de vítimas. Nada como o conforto de ser uma vítima. Afinal, quem ousa questioná-las, quem ousa não lhes dar atenção? E, mais uma vez, só você... só você para me fazer compreender as coisas dessa maneira.

5:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Oi Eduardo! Massa o que vc disse sobre "entre umas e outras"!Vou tentar visitar seu blogger mais vezes! Passa lá no meu blog barraco! Rsrsrs Bjim!

11:05 PM  

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