Descaminho

14.10.04

O remorso de Sorin e de Lynch


Histórias Mínimas e História Real: para os dois filmes, o remorso move o mundo

Histórias mínimas, de Carlos Sorin, lembra, em alguma medida, História Real, de David Lynch. No filme argentino, que sai de cartaz em Goiânia hoje, temos como eixo principal um idoso que, sem rumo na vida, sai pela estrada a procura de um cachorro desaparecido, para quem pretende pedir desculpas. No filme norte-americano, um fazendeiro idoso atravessa estradas do interior do país a bordo de um mini-trator para rever o irmão doente e... também pedir desculpas. O remorso move os dois personagens, que procuram algum sentido no resto de vida que têm.

O filme de Lynch mantém um certo respeito pelos personagens, em especial pelo principal. Sorín joga holofotes no que considera insignificante na vida das pessoas, como que tentando provar a auto-condenação dos povos. A esperança, em Lynch, nasce e permanece na figura do fazendeiro corajoso. Em Sorin, precisa ser transferida para outro personagem, um vendedor adepto de livros de auto-ajuda, mas que também não se livra da visão esteriotipada do diretor.

História Real e Histórias Mínimas nos fazem ter piedade de seus personagens e, por vezes, se perdem no sentimentalismo. Por isso, são filmes que emocionam, em extremos opostos. O primeiro, até por ter mais recursos técnicos, capricha nas imagens plásticas e na belíssima trilha sonora. O argentino, ao contrário, tenta emocionar com a falta de recursos. Mas um e outro não saem da armadilha melodramática.

4 Comments:

Blogger André Pupulin said...

não assisti História Mínimas, o História Real eu vi e gostei. Gostei do Blog. Abraços! André Pupulin

5:26 PM  
Anonymous Anônimo said...

O contraste de "História real" com "Cidade dos sonhos" é interessante. O primeiro é uma narrativa em linha reta, com o homem e seu cortador de grama, viajando por uma estrada em linha. No segundo, David Lynch começa outra história que parece em linha reta com se fosse revelar quem é aquela mulher de cabelos pretos e sem memória. Quando tudo parece em linha reta, há um corte com a cena da caixinha. A partir deste ponto, começa outra história. Acho que a primeira parte de "Cidade dos sonhos" é o sonho da personagem loira, no qual tudo se realiza. A segunda parte mostra o "real", o despertar, a vida difícil da personagem. Curioso saber qual será o próximo passo de Lynch. Quanto ao cinema argentino, ele é muito bom, até melhor que a da retomada dos anos 90 no Brasil. Aqui o que salva é Reinchbach (é assim que se escreve?) e Sérgio Binachi, que está vindo com mais uma pedrada com a adaptação do conto machadiano "Pai contra mãe".

3:35 PM  
Blogger Eduardo Horácio said...

Na verdade todos os filmes de David Lynch são na linha de "Cidade dos Sonhos", a começar por Veludo Azul e Twin Peaks. História Real é a exceção do diretor (no caso de Lynch, o lado "experimental"... risos). Mas gosto de toda a obra dele, apesar de dar umas tropeçadas em "História Real".
Engraçado você gostar de Sérgio Bianchi e Carlos Reichenbach, que fazem cinemas tão díspares. O primeiro opta pelo cinismo e, o segundo, consegue ver o belo até onde não existe.

4:36 PM  
Anonymous Anônimo said...

Nos filmes mais recentes, Bianchi e Reichenbach partem da arte para falar da sociedade. Não vejo cinismo em "Cronicamente inviável", mas sim um pensamento de que este país deu errado. É um tema complexo porque dialoga com a sociologia de um Francisco de Oliveira, a filosofia de Paulo Arantes e a crítica literária de Roberto Schwarz. Segundo eles, a sociedade brasileira não deverá alcançar o "primeiro mundo", e várias obras como a de Bianchi ou literárias (Luiz Ruffato, de "Eles eram muito cavalos") internalizam a forma social na narrativa. Ruffato trata de uma São Paulo movida a violência e a consumo, interligados no seu quase romance. São trabalhos fragmentados. O filme "Garotas do ABC" conta a história de uma região do país onde nascem o maior partido de esquerda do Brasil e um arremedo de fascismo dos carecas do ABC. Reichencbach tenta olhar de perto essa mentalidade da operária fã de Schwazeneger, que se tornou um político muito conservador. Ou seja, é o país inviabilizado. Uma boa obra de arte, para ser chamada assim, não busca o belo. A poesia nào tem que perfumar a palavra "flor". Mas, como diria Freud, uma obra de arte antecipa formas de ver o mundo que serão depois sistematizadas pelo conhecimento sociológico, antropo....

5:50 PM  

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