Descaminho

21.10.04

`Só Carolina não viu`


Um filme e duas Carolinas: 'o tempo passou na janela e só Carolina não viu'

Parte do cinema nacional recente, especialmente aquele produzido pela Globo Filmes, tem repetido uma sutil estratégia que faz o cinema daqui ser cada vez mais americano.

A idéia é pegar diretores ruins e medianos do cinema nacional para dirigir filmes com elenco de primeira e alta profissionalização.

Vamos aos exemplos. Um, notável, é Cazuza. Sandra Werneck, como se sabe, é reconhecidamente uma diretora de poucos recursos. Foi escalada para dirigir o filme, mas com o auxílio de Walter Carvalho (papa da fotografia). O roteiro caiu na mão de Victor Navas e Fernando Bonassi, dois dos principais nomes da nova geração brasileira. A interpretação dos protagonistas foi toda ensaiada por Walter Lima Jr. No elenco de Cazuza, ninguém fez feio. Reginaldo Farias e Marieta Severo brilham tanto quanto Daniel Oliveira e Leandra Leal.

Vi hoje A Dona da História. Outra vez, um diretor reconhecidamente fraco: Daniel Filho. Para ajudá-lo, João Emanuel Carneiro (simplesmente o roteirista de Central do Brasil) que adaptou a ótima peça de João Falcão. No elenco, Marieta Severo, Leandra Leal, Rodrigo Santoro e Antonio Fagundes (dos quatro, apenas este último não é do primeiro time).

Assim, deficiências de um e de outro diretor são amenizadas. Exagero dizer que o cinema autoral morreu ou caminha para isso, mas cada vez mais o cinema brasileiro se parece com o americano. Por lá, há muito tempo ficou resolvido que o cinema é fortemente feito em torno dos atores.

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Se alguém acha injustiça dizer isso de Daniel Filho, compare A Dona da História com A Partilha (possivelmente um dos piores filmes já feitos pelo cinema nacional, especialmente por ter sido baseado na peça sofrível de Miguel Falabella e por ter engessado João Emanuel Carneiro).
Se alguém pensa que Sandra Werneck está sendo injustiçada, veja a linguagem de Pequeno Dicionário Amoroso e Amores Possíveis.
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Em suma, A Dona da História conta a história de Carolina no passado e no presente. Acontece um auto-embate entre a jovem cheia de sonhos e a senhora cansada de um casamento de mais de 30 anos. Tudo bem que a história é bobinha, mas não fica atrás das comédias românticas dos Estados Unidos.

Um crime, no entanto, é comedido. O que se faz com Débora Falabella no filme é terrível (ótima atriz que é quase desperdiçada). Perceba a gravidade: ela interpreta praticamente a mesma personagem de Lisbela e o Prisioneiro (quando é uma jovem ingênua que sonha ser atriz e vive dizendo que a vida é um filme).

O resultado é que o diretor perde a oportunidade de explorar bem o potencial de Débora. Potencial que foi visto, em 2001, em Françoise (um dos melhores curtas que o cinema brasileiro já fez) e em 2003 com Dois perdidos em uma noite suja.

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Por fim, um alerta para quem pretende ver especificamente este filme em Goiânia: a cópia do Cine Stadium Center (do Flamboyant) está ruim, cortando trechos inteiros do filme original. Se não quiser passar raiva, passe longe de lá.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Há uma certa distância - tanto física, quanto de talento e até uma diferença descomunal nos nomes - entre Débora Falabella e Leandra Leal para confundir uma com a outra em A Dona da História!

5:41 PM  

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