Descaminho

19.11.04

Diários de Motocicleta segue em cartaz



Diferentemente do previsto, não saiu de cartaz ontem o filme Diários de Motocicleta. O bom público que tem comparecido às sessões do Cine Cultura fez com que o cinema prorrogasse a exibição do filme por mais uma semana.

A película conta a primeira viagem do então quase médico Ernesto Che Guevara e seu amigo bioquímico Alberto Granado pela América do Sul, época em que tomaram consciência das desigualdades sociais do continente.

Baseado em dois diários dos protagonistas, o filme de Walter Salles tem Gael García Bernal (foto acima) no papel de Che e Rodrigo de la Serna interpretando Granado.

Vi o filme ontem pela terceira vez, a primeira no Cine Cultura. O cinema da Praça Cívica deu um ar mais "intimista" para a história, em função da tela menor e do som mais rústico.

Ficou mais claro para mim o domínio pleno da técnica por parte da equipe de Salles, o bem-contado road movie e o humor bem dosado.

De problemas, diálogos rebeldes pouco convincentes e descontextualizados por parte de Che e o exagero nas histórias de farra, bem diferente do que ocorre nos livros originais de Che e Granado.

O filme tem dificuldades em convencer o espectador da transformação por que passou Ernesto até virar Che Guevara e, infelizmente, mais parece uma visão do diretor que acaba de descobrir a América Latina do que do próprio Che. Teria o diretor se autoprojetado na imagem de Che e, a partir disso, feito dele uma espécie de alter ego esquerdista?

Verdade que são raros os diretores que escapam da tentação autobiográfica (o que, por si só, não é algo bom ou ruim), mas Salles exagera ao moderar ainda mais um Che Guevara que, jovem, já era muito moderado.

O filme é entretenimento de boa qualidade. Aliás, é mais do que isso. Mas tem problemas, alguns até sérios, inclusive as tradicionais recaídas melodramáticas na metade final. O que mostra que Salles, ao contrário do que se imaginava, não amadureceu. Está ainda jovem, no mau e bom sentido, e sonha em descortinar o mundo. Enquadra personagens históricos na sua visão pessoal de sociedade, gerando inverossimilhança. E se mostra aberto ao diálogo, ainda que ninguém saiba em que medida.

4 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Grande Dudu!

Parece que a ficha finalmente caiu: o que falta a "Diários" é mesmo convencer o espectador sobre a transformação de Ernesto em Che. Walter preferiu investir num "turning point", a travessia do rio a nado, que ele pinta com cores heróicas. É uma visão muito particular. Che contava suas aventuras de forma diferente, sem nenhuma solenidade. Definitivamente, o Ernesto de Walter não é o Ernesto de Che. Mas o filme já vale a pena só pelo clima "on the road".

Abraço,
Marco.

2:58 PM  
Blogger P.F. said...

Engraçado... Eu não reparei nada dessas coisas que você diz sobre os defeitos do filme. Por isso que é bom ler esse blog. Depois de ver o filme, óbvio!

3:19 AM  
Anonymous Anônimo said...

Ainda não assisti Diários...sou apaixonada pelo Gael, mas tá faltando achar tempo pra ir ao cinema, acho que vou esperar pelo DVD...
Beijo!
Roberta

6:10 PM  
Anonymous Anônimo said...

Walter Salles conseguiu a proeza de fazer um filme de Che Guevara sem política. Sinal dos tempos de despolitização. Como o restante da obra de Salles, é uma furada completa. No "Central do Brasil", existe um conservadorismo na estrutura do filme que chega a ser constrangedor. O Rio, ambiente urbano, aparece como o inferno na Terra. A felicidade está num conjunto habitacional da Cohab (!), no sertão nordestino, onde os irmãos de Josúé têm todos nomes bíblicos. Logo, o atraso da comcepção das casas da Cohab! Esse ideal comunitário é romantismo de meados do século XIX. Nos "Diários", surge a pedagogia da viagem, a coisa mais furada que existe também. É primário.

7:46 AM  

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